segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

India dos sonhos


Este foi o filme vencedor da edição 2009 do Festival Internacional de Cinema de Turismo, em Viena. Falei no post Cinema para viajar (aqui no Bombocado e em primeira mão, busca lá por novembro) que Florianópolis é a representante do Tour Film Brazil para a América Latina (Santa Catarina captou esse megaevento no final do ano) e vai receber o Festival em maio próximo. No lançamento que aconteceu aqui na capital na semana passada a platéia embarcou nesse vídeo (Incredible India) que foi muito feliz ao representar a essência do turismo como experiência, valorizando as emoções e as sensações. Essa é a pegada do marketing especializado em viagens e turismo dos destinos mais competitivos do mundo. As vivências são o que tornam uma viagem inesquecível. O slogan "Brasil Sensacional", criado pela Chias Marketing para a Embratur, saiu de uma pesquisa com turistas estrangeiros que conheceram algum destino brasileiro. A pergunta era que palavra traduzia a experiência vivida no País. A maioria cravou "sensacional!". Um colega de trabalho que esteve recentemente na Índia para o casamento da filha (com a cerimônia tradicional que muitos brasileiros conheceram  pela última novela das oito) relatava sua passagem pela comunidade tibetana, sua viagem de sete horas até a nascente do rio Ganges e nem precisou verbalizar o que sentia enquanto exibia suas fotos. Tava nos olhos dele:  incrível! E na bagagem, além das emoções, ele a e a esposa trouxeram muito curry, chá, incenso e panos. Vou lá preparar uma receitinha qualquer hora com eles.
Faz pouco tempo eu sonhei que descia por escadarias intermináveis, meus cabelos soltos e muito mais longos do que realmente são estavam enfeitados com lenços de todas as cores. Uma fumaça perfumada dos incensos se espalhava com a brisa fresca e a música me alegrava como não sei descrever. Pois quando o operador apertou o play desse vídeo no lançamento do Festival ativou minha memória onírica. Agora durmo sempre pensando em embarcar no dia seguinte pra Índia. Hoje só amanhã.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Pera, uva, maçã


Salto da cama às 8:30 em ponto com a receita de torta de meu colega de repartição Fefê (MC de eventos, organizadores de grandes festas, carnavalesco e babados afins) na cabeça. Compro mais fruta do que conseguimos consumir em casa e aí elas ficam com aquela cara de ontem. E foi de tanto ouvir essa minha ladainha que Fefê ordenou:  - pega aí um papel e uma caneta que vou te ensinar uma torta fácil para você fazer com suas bananas moles. A receita ele aprendeu quando foi morar sozinho, nem sei quanto tempo faz, ele é uma criança grande com um coração enorme.
Sua cara de nojo quando eu disse que ia preparar um doce com a penca de bananas escurecidas, usando açúcar mascavo me fez repensar. Já disse que não sou boa com doces, mas topei aprender. Não se trata de uma receita complicada, nem exige batedeira (me aborrece ter de lavar aquelas hélices) e fica uma delícia. A vantagem é que você pode usar outras frutas, pera, uva, maçã...melancia não, né?
É assim: junte cinco colheres das de sopa de farinha de trigo (pode ser da integral, se preferir), mais cinco de açúcar, cinco de fermento. Misture tudo. Depois corte as bananas (ou outra fruta) em fatias médias. Unte uma forma com margarina e comece a montar a torta colocando uma camada da mistura de farinha, outra de banana e vá adiante. Aí, você bate (na mão mesmo) um ovo, com uma medida de uma xícara de leite e canela. Regue a torta com essa mistura, procurando distribuir bem por toda a enxtensão do tabuleiro. Aplique colheradinhas de margarina sobre a torta e mande para o forno. A minha ficou uns vinte minutos até dourar bem.
Não sei vocês, mas eu adoro banana e é raro não ser dessa fruta meu pedido em confeitarias e padocas. A menos que me engane. Como uma vez em Paris (ai, que tuda!) quando eu e minha sista Virgínia babamos por um doce na vitrine de uma loja e fomos logo pedindo dois, um para cada. E era enorme, parecia apetitoso, mas não era. Nem posso lembrar daquele gosto horrível de ovo. Ambos foram parar na lixeira da primeira esquina. Aprendemos a perguntar (e olha que ela fala francês!) e a dominar os impulsos motivados pelo zóião.
Foto da torta que fiz na próxima semana, ok? Vou fazer uma maior, essa já foi. Meu segundo doce é uma homenagem à Ofélia Ramos Anunciato e sua cozinha maravilhosa. Ela é minha Julia Child, autora da coleção de livros com acabamento dourado que minha mãe usava na cozinha nos anos de 1970 e apresentadora do programa do qual a Renatinha Pop sonhava em ser produtora. Não duvido que ainda sonhe.

Julie, Julia e eu

Famintas desde a hora do almoço e sedentas pela programação das 21:40 no cinema, eu e minha fiel escudeira não esperávamos rir tanto, como há muito não fazíamos. Devoramos uma pizza média de atum (eu prefiro aliche, mas...) e portuguesa em 15 minutos e disparamos para a Sala 2. Por nada eu perderia esse filme, falei no post sobre o livro de receitas afrodisíacas e contos de Isabel Allende, lembram? Uma louca  Julia Child (Maryl Streep) garantiu quase todos os momentos de total descontrole sobre nossas gargalhadas na fileira quase vazia que nos permitiu tirar os sapatos e nos estarrarmos como no sofá de casa. Outra atrapalhada, mas apaixonada Julie Powell (Amy Adams) me fez refletir sobre algumas patinadas (sim, eu já liguei pro trabalho e avisei que não ia, chorando com o pé inchado por uma megatorção causada pelo pudim de leite espatifado no chão da minha primeira cozinha) entre receitas que não deram certo e saborosos bocados de vida.
Recomendo, muito, muito mesmo Julie& Julia e queria ter o livro de cozinha para mulheres americanas sem empregadas. Lá pelas tantas tem Talking Heads (psyco killer) no hilariante assassinato das lagostas. Isso me comoveu e me fez cantar bem alto (eu não temo platéias, ainda mais quando são pequenas como essa de hoje). E eu amei a blusinha com estampas de cerejas (o botton de Julie é meigo) em perfeitas leituras aplicadas para as duas personagens em cenas sequenciais.

Entre hmmmmms e eeeeeeecas, vamos lá, deixa eu listar o que nunca vou tentar preparar até porque jamais tive coragem de provar: ovos nevados (putz, que nojo, não esperava ver essa receita no filme)  e ossobuco (não tá no filme, mas tenho trauma causado pelo incidente que presenciei certa vez com meu colega de trabalho "uógner" que um dia eu conto). E quanto a desossar um pato ou qualquer outra ave, ainda vou tentar. Acho isso mágico, já vi feito, mas quero acompanhar o processo, dominar a arte. Só não me desafiem a matar nada. Aliás, em Afrodite, Isabel Allende também relata (e repudia) algumas atrocidades inevitáveis em receitas que "inibem a libido" em frações de segundos. O romance fofinho de Julie e Eric rende deliciosos suspiros. Como não gosto tanto assim de açúcar, cheguei em casa doida pela trufa de chocolate, mas me contentei com a gelatina de framboesa. Tinha esquecido que foi minha dose de ontem, depois do jantar. Também amo manteiga Julie e Julia, mas só uso na culinária. Meu café da manhã, já faz algum tempo, é chá branco, fruta e bisnaguinha com requeijão light. Iogurte pra variar. Tá bom, cada coisa a seu tempo.   

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Entre jaqueiras e palmeiras reais


Foi com minha tia Lina (Acolina Santoro) que aprendi a cantarolar marchinhas e draminhas de Dalva de Oliveira. Quando eu brincava no quintal do casarão da vovó, sobre as jaqueiras, no subúrbio carioca, vestindo calcinhas brancas e enormes com babadinhos de renda no bumbum, sem "me sentir" (ainda) uma pin- up, também ouvia suas histórias sobre a prima, a atriz Fada Santoro (tem vários filmes com Cyll Farney). Na semana passada, tia Lina, bem lúcida aos 80 anos me veio em deliciosa lembrança com cheiro de talco, por causa da minissérie da Globo. Não acompanhei os capítulos da saga de Dalva (e seu Herivelto machistauó) mas vi alguns pedaços e, com isso, pude participar de alguns momentos culturais no cafezinho da repartição. E foi com meus saberes adquiridos pela origem plebéia da Zona Norte carioca que fui contemplada com as melhores memórias desse Rio antigo (ele me encantará até o fim dos dias, com os cenários históricos como os Arcos da Lapa e o bonde de Santa Tereza).
Desembarcou sobre minha mesa de trabalho, já na primeira semana do ano O morro e o asfalto no Rio de Noel Rosa, um presente e tanto. Com textos de João Máximo (jornalista, escritor, pesquisador e crítico musical, um profundo conhecedor da obra de Noel Rosa e parceiro de Carlos Didier, outro biógrafo do poeta musical) o livro traz um CD de canções (são 14, das 300 que Noel deixou) imortalizadas e fotos do saudoso cenário carioca dos anos de 1930. Uma jóia.
"Eu nascendo pobre e feio, ia ser triste o meu fim
Mas crescendo a bossa veio
Deus teve pena de mim"

Viva Noel Rosa, que não me ouça, jamais deveria ter ciúme da Bossa.   

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Experimentos e as felizes coincidências

Eis que no dia anterior ao jantar (que bela noite, gracias amigos!) de Ano Novo na casa dos Simon, naquele mesmo cenário, diante das crianças a se esbaldarem na piscina, as mulheres teciam uma colcha inteira de retalhos sobre a vida. Pelo menos três gerações reunidas, uma infidável pauta, inesgotáveis histórias de vida, um prato cheio para a recém-chegada ao grupo. Não perdia um só detalhe do que ouvia, embora meus olhos escapassem, vez ou outra, para a minha pequena serelepe dentro d'água.
O patriarca, de livro em punhos, mergulhado em Cem anos de solidão (Gabriel Garcia Márques) fazia breves incursões sobre determinados assuntos. Homem de firmes posições, mente lúcida e bem humorada que não perde a chance de contar bons causos extraídos do trabalho desbravador como engenheiro (construindo estradas) ou da vibrante trajetória sobre a qual ergueu os alicerces de sua vida e de sua generosa e numerosa família. Empresta sabedoria e acolhe em declarado afeto a todos. As quatro mulheres da casa, assim como as filhas e netas que vivem fora e agregados. A matriarca precisamente ( e preciosamente) talhada para o posto completa as lembranças, corrige uma ou outra falha cronológica das narrativas as quais abrilhanta, como musa, heroína de carne e osso, a companheira desde sempre.
Ela e a filha (a que me trouxe para o prazeroso convívio com os Simon, por intermédio de nossas pequenas Isabelas) me proporcionaram a então feliz coincidência para o início das experiências que faz tempo ensaiava.
Ao declarar meu gosto pela obra de Isabel Allende (jornalista que se lançou ao universo literário em 1982) a Sra. Simon e a filha começam a despejar seus títulos sobre o sofá da sala. O reino do dragão de ouro (esse eu quero também!) A soma dos dias, Hija de la fortuna (em espanhol, adquirido na temporada da filha na Espanha) e Afrodite, o que me fez ter de conter o impulso de pedi-lo emprestado. Esperei o momento certo, afinal não são todas as pessoas que têm o desprendimento de deixar seus livros sob a tutela de terceiros. Contei que descobri Isabel Allende pesquisando sobre cozinha regional, pratos exóticos, sobre a relação da comida com a sociedade e a história. E que, embora aquela obra, Afrodite, me despertasse maior apetite do que A casa dos espíritos, não era a hora de mais investimentos. Início de ano é sempre aquele aperto, matrícula dos filhos, impostos, faturas do Natal e de raros escapes para um lazer salutar de recesso.

Como quem oferta um prato de sua mais apurada culinária, a filha me entrega o livro nas mãos e diz para degustar mais os contos do que as receitas (afrodisíacas) do conteúdo que me apetecia. Tem razão a minha amiga, de destino preparado pelas mãos de um chef (por mais amargos que certos ingredientes pareçam, podem dar imensurável sabor à vida, se soubermos aproveitar e ela soube) sobre a função deste valioso livro que tenho em mãos. Devorei dois contos e fui para a cozinha temperar um suculento pedaço de pernil suíno com um líquido inspirado em algo que, há alguns anos, provei sobre lulas gratinadas, no litoral paulista: o molho Gengiskan, feito à base de maçã verde, gengibre e shoyu. Sua consistência original é mais pastosa, mas quis regar a tenra carne, então acrescentei um tanto de água para diluir o molho. Refrescante, aromático, aguçador de todos os sentidos. Tudo batido no liquidificador (meia maçã verde, um pequeno pedaço de gengibre sem casca e duas colheres das de sopa de shoyu). Depois de temperado com sal, limão e alho, reguei o pedaço de carne utilizando esse caldo e levei ao forno. A cor fica de um bronze mais escurecido, mas sem ressecar. Carne macia e saborosa, leve e estimulante. Umas folhas de hotelã para decorar o prato e raspas de gengibre, se quiser deixar uma pista sobre o segredo do prato. Não segui receita nenhuma, nem do livro, nem a que guardei do molho servido com as lulas. "As pessoas que ganham a vida com esforço e rezam escondidas, como você e eu, improvisam o melhor possível entre as panelas e entre os lençóis, aproveitando o que se tem à mão, sem pensar muito no assunto e sem muita pompa, agradecidas pelos dentes que restam e pela sorte imensa de ter a quem abraçar", argumenta Isabel Allende sobre o porque escrever Afrodite.
Prometo mais receitas e prosas para os próximos posts. Ah, se vou assistir Julie & Julia? Não perco por nada. Li a entrevista com Julie Powell na Marie Claire e fiquei com aquela sensação que temos de já ter ido a algum lugar, visto alguma cena ou ouvido algo. É que, quando criei esse Bom Bocado, há mais de dois anos, a ideia era colocar nele minhas vivências e sobrevivências, com letras e panelas. Tinha, ainda, a minha cozinha saudável de educação nutricional (Sinhá Saúde) para crianças em uma rede privada de ensino, em Florianópolis, e sonhava partir dela adiante, nesses trilhos. Não sei se na cozinha ou no teclado, quem sabe nos dois, retomo esse caminho. Já calcei meus sapatos de Dorothy.